Feto

A gata começou a sangrar pela manhã. Deixou manchas vermelhas como testemunhos das suas transgressões nos sítios por onde tinha passado e onde não deveria ter estado, como em cima do frigorífico.

Preparou-se a sair, preocupada mas também chateada com o contratempo. Tinha outros planos. Café, pequeno almoço, duche.

Ao sair do chuveiro viu uma forma nova no chão ao lado da sanita. Cocó? Vómito? Olhou melhor. Um gatinho calvo e quase perfeito envolvido por uma fina membrana transparente. Não mexia, mas ao pegar nele ainda estava quente.

A gata ainda era muito nova. Talvez por isso. Lembrou-se das duas ou três vezes que a tinha encontrado num canto, apavorada, no jardim do vizinho. Devia ter acontecido numa dessas vezes.
Sentiu uma certa tristeza. Ainda pensou guardá-lo mas não sabia com quê. E para quê?

Pô-lo no lixo.

A gata já não sangrava.







Eva Oddo

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