Interesse
Tratá-la por «tu» tinha sido descabido, mas agora estava feito, pensou. Entrou em casa, pousou as chaves na cómoda, junto à fotografia da mulher. Enquanto arrumava as compras, perturbou-se com a imagem do sorriso solto que ela lhe retribuíra no supermercado e deixou-se levar pela imaginação. Pela primeira vez desde que ficara viúvo despertavam em si sentimentos há muito esquecidos, mas lembrando-se do carrinho dela carregado de coisas para crianças não quis acalentar esperanças.
...
Não era mulher de introspeções, mas deu por si a pensar naquele encontro. Sentiu-se confortável com o sorriso oferecido (afinal, apenas respondera ao seu cumprimento) e satisfeita com o seu próprio aspeto. Recordou o conselho da sua avó «nem para o supermercado deves ir desmazelada» e desejou voltar a encontrá-lo. Perdida nestes pensamentos chegou ao destino, tocou à campainha e disse pelo intercomunicador: «Então meninos, a vossa mãe está melhor? Ajudem-me, comprei-vos montes de coisas»
Miguel Madeira
Um bom texto Miguel! Parabéns.
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