Cartas (1)

 

Querido filho,

Esta dor da tua ausência leva-me a devaneios sem freio, pois só me resta falar contigo, a sós, pelos cantos da casa. O teu pai teme que eu enlouqueça e zanga-se, pensando que o tempo tudo cicatriza; não te gerou, nem te lançou no mundo, mas sei que tudo faria para que voltasses. Urge que te diga — o nosso amor por ti é inabalável.

Naquela funesta manhã de fevereiro, há precisamente vinte anos, demos um beijo e desejei-te, como sempre, um bom dia de escola. Desde aí, apenas a tua sombra vagueia na minha mente alucinada. Nem sequer sei se vives, e esta angústia mata-me. João, dá-me um sinal, peço-te, senão…

Abraço apertado da mãe,

Bina

Escrito por: Leonor Lagos

 

 

 

 

 

Tu não.

Num norte sem ti perco-me em memórias que guardo, com o maior carinho do mundo.

Nos olhos marejados de água por já me faltares guardo a cor do teu olhar, do teu sorriso terno.

E na terra de pomares sem fim, a lembrança do cheiro da tua pele, da tua mão que me afagava o rosto, à chegada.

Avô, quando, no nosso norte querido, a toalha branca, pura, se estender sob a mesa, lembrar-me-ei de ti. No calor da lareira que nos ilumina, nos sabores transmontanos que nos aquecem a alma.

Sentado no topo da mesa cheia, voltas a dedilhar o teu bandolim, sorrindo.

E eu sorrio também.

Porque te vivi.

 

Obrigada, sem fim.

 

Tua neta Carol.

 

Escrito por: Carol

Comentários

  1. Parabéns. Que assim continuem. Beijinhos

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  2. Carol diz-me se tiraste um curso de narrativas ao acaso no verão do ano passado... Diria que este maravilhoso texto é daquela menina sensível de uma maturidade gigante que nos arrebatava com a sua escrita e com quem fiz o primeiro exercício do curso. Beijinhos

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  3. "Querido filho..." infelizmente uma realidade para muitos pais e ninguém se pode sentir a salvo. Texto com intimismo, a gerar empatia. Bem conseguido.

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  4. "Tu não". Tão original este começo!

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