Entrevista - Isabel Olivença, Autora

A Isabel faz parte do maravilhoso grupo de escritores do torneio de Outono de 2020.


Como já tem livros publicados, acedeu a partilhar a sua experiência numa pequena entrevista por escrito. Muito obrigada, Isabel!


Fale-nos um pouco sobre o seu livro, por favor! 

De carne se faz o poema”, livro de poesia editado pela Nova Mymosa, em outubro de 2020. Tem a dimensão de um pequeno caderno moleskine, formato que parece induzir cada leitor a tirar notas, sublinhar, escrever os seus desentendimentos ou entusiasmos com os poemas impressos, que são 18. Estes poemas criados entre 2018 e 2019 foram seleccionados depois de trabalhados numa oficina de poesia com o Professor Luís Carmelo. Invertendo o sentido do título, pode-se dizer que «da palavra se faz carne», colocando-nos perante o que nos inquieta – oposição ao conformismo – numa tentativa de diálogo com o real, descendo à rua ou ruas e, no entanto, sabendo que a subjectividade do mundo e a sua representação é tarefa árdua.

 

meia-laranja

laranja e meia

a vida inteira

cabe nessa metade

de rua

à maria pia

maria-vai-com-as-outras

maria triste

triste-feia

a rua

que sobe e desce

a rua

maria pia

maria feia

volta e meia

sobe e desce

a rua

pica a pele dura

espeta a agulha na veia

a vida por inteiro

na meia-laranja

triste-feia

a rua

 

Como é para si o processo de escrita? (como escreve? Quando escreve? Porque escreve?...)

Escrevo sempre que posso, a qualquer hora do dia ou da noite, no tempo que tenho livre. Uso técnicas diferentes: escrita automática, técnica de rasura, escrita por temas a partir de notícias, de imagens (podem ser fotografias ou pinturas). Não vivo para escrever nem escrevo para viver, escrevo porque a palavra é uma forma de libertação e de provocação, porque nos transcende e pode atingir o outro nas suas emoções e sentimentos.

 

Como surgiu a ideia de o publicar? Foi difícil encontrar editora? Como está a correr essa experiência? 

 Foi o Professor Luís Carmelo que me convidou a publicar na Colecção Crateras da sua editora Nova Mymosa, colecção que integra escritores de reconhecido mérito implantados no mercado livreiro e escritores desconhecidos do grande público e do meio literário. Escrevendo por prazer, gosto também que me leiam; os poemas, depois de saírem de mim deixam de ser meus e muito me agradaria que provocassem uma reacção nos leitores, transformando algo neles. Em Portugal, que muitos chamam de «país de poetas», poucas pessoas lêem e compram poesia. Para quem tiver interesse, o livro encomenda-se online:  http://escritacriativaonline.net/livraria/craterasp05_isabelolivenca/

 

 

Que conselhos daria a quem sonha publicar a sua obra?

R: Dificilmente se escreve sem que primeiro se leia, e muito, e bem. Escrever  todos os dias, praticar a narrativa gerindo o tempo disponível, usando o terreno e a endurance dos maratonistas ou uma pista de atletismo para provas rápidas de 200 metros. Que ninguém fique à espera das musas. Eu não esperei por essas ansiadas visitas nem tomei anfetaminas, simplesmente desenvolvi a carreira profissional noutra área de actividade. São opções de vida. Quem não tiver formação superior em letras e literatura, que é o meu caso, beneficia em frequentar cursos de escrita criativa, oficinas do conto, da poesia ou de outros géneros, workshops de filosofia, ciência, história; enfim, alargar horizontes, não fechar a porta a qualquer tipo de conhecimento. Concorrer a prémios de literatura, insistindo sempre (nunca se sabe). E o mais difícil, mas não impossível, é encontrar alguém do meio literário que acredite no seu potencial e seja o seu mentor.

 

 

Que sugestão deixaria aos seus leitores?

Pelo que me tenho apercebido, em Lisboa, depois dos anos 70, só há poucos anos recomeçou o burburinho dos lançamentos e apresentações de livros e das tertúlias, eventos agora realizados online. Penso que as escolas de artes e escritas poderiam ser uma plataforma de dinamização destas actividades e até de debate e encontro entre pessoas que escrevem ou lêem ou pintam e desenham. É preciso fomentar o encontro e a reflexão, pelo que me parece ser um Clube de Leitura uma boa alternativa.

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